I SIMPÓSIO EM CIÊNCIA DAS RELIGIÕES: PLURALISMOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
(http://www.cchla.ufpb.br/simposioreligio/index.php?option=com_content&task=view&id=2&itemid=3)
“Justificativa
O Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões – PPGCR – foi autorizado pela CAPES em julho de 2006. É o primeiro programa do Nordeste e o segundo do Brasil a ser oferecido por uma universidade federal; todos os demais são programas oferecidos por universidades confessionais.
Mais que um curso novo, somos inovadores. O PPGCR resultou do GIP-RELIGARE - Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Religião e Religiosidade - e do êxito da experiência do Curso de Especialização em Ciências das Religiões - CECR . Vale ressaltar que o PPGCR é o primeiro programa de pós-graduação a se intitular no plural – CiênciaS das ReligiõeS - por acreditarmos na existência da multiplicidade dos métodos para se chegar ao conhecimento, tanto quanto na multiplicidade do nosso objeto de estudo: as Religiões.
Depois de séculos de predomínio polarizado entre religião e ciência, hoje temos condições de olhar para trás e ver que, se a ciência foi redutora em seus primórdios, por presumir que detinha a "verdade absoluta", ela foi grandiosa no combate à intolerância, ao livrar o Ocidente da estreiteza da "verdade absoluta” imposta pelo catolicismo romano, deixado por Constantino e aprofundado nos tempos inquisitoriais. Depois de ter sido adotado oficialmente pelo Império Romano, a “religião” passou a ser sinônimo de "Igreja Católica Romana" ou, no máximo, "cristianismo". Assim, nada mais “natural” do que a utilização monolítica dos termos "ciência" e "religião" no singular.
Entretanto, a realidade é dinâmica e tudo muda. Depois de séculos de dogmatismos, religioso ou científico, a humanidade está redescobrindo que tudo é relativo, que neste mundo dialético não é possível nenhuma verdade absoluta, que ela é sempre relativa, não importa de onde venha.
Ernest Cassirer[1] no Ensaio sobre o Homem, afirma que “deveríamos definir o ser humano como animal simbolicum, e não como animal rationale”. Para Cassirer, a dimensão racional exclui a dimensão imagética e emocional reduzindo o ser humano a apenas um aspecto de sua inteireza. O ser humano é muito mais que um ser racional. O ser humano só é o que é pela interação complementar entre compreender e sentir, entre razão e sensibilidade, e ambas são expressas através da dimensão simbólica.
Observada a linha do tempo, as Ciências das Religiões parecem ser uma área recente de estudos, mas quando cotejada com as Ciências Sociais, ambas têm a mesma origem e os mesmos fundadores. Embora nascido concomitantemente com as Ciências Sociais, o estudo das religiões permaneceu como sub-área dentro da Sociologia e da Antropologia e só, recentemente, vem adquirindo relevância cada vez mais expressiva, não pelo desejo dos seus teóricos, mas por um imperativo colocado pela própria realidade.
Acreditamos que os graves problemas colocados pelo mundo contemporâneo estão dando à humanidade a oportunidade de refletir sobre dogmas e intolerâncias. Questioná-los e discuti-los pode levar a humanidade a dar-se conta de uma outra possibilidade, a de que Deus foi, é, e sempre será re-criado à imagem e semelhança dos seres humanos, homens e mulheres de cada tempo, de cada lugar, de cada civilização. Os seres humanos são produto e produtores de cultura. Cultura é diversidade, é multiplicidade, é metamorfose constante, integrada aos diferentes tempos históricos e espaços geográficos. A tarefa do mundo científico é compreender esta dimensão humana e suas repercussões para a vida em sociedade.
Este é o propósito do PPGCR. Ele nasceu plural e laico, portanto, não se coloca na perspectiva de um curso de teologia. Seu objeto de estudo não é Deus, mas compreender como os seres humanos criam os seus deuses e suas religiões, e, consequentemente, os códigos de conduta que se relacionam a estas representações. Esta dimensão será abordada na linha de pesquisa intitulada Religião, Cultura e Produções Simbólicas.
A segunda linha de pesquisa do programa se intitula Espiritualidade e Saúde. Ela busca estudar a correlação entre fé e cura, e nisso o PPGCR é igualmente inovador, por ter lançado uma linha de pesquisa que se propõe estudar a relação entre Espiritualidade e Saúde dentro dos métodos científicos.
A proposição desta linha de pesquisa só foi possível por fazermos parte de uma universidade federal que tem curso de medicina há mais de 30 anos. Três dos cinco docentes integrantes desta linha de pesquisa são professores de medicina há mais de 20 anos, sendo dois professores de Imunologia, cujos estudos de ponta abarcam as dimensões psicológica e imagética do paciente (psiconeuroimunendocrinologia).
Por outro lado, estudos recentes internacionais comprovam a eficácia de certas práticas “complementares” à medicina tradicional, que atuam favoravelmente sobre a saúde, ocasionando as chamadas "curas milagrosas" realizadas pelas vias espirituais. Estamos diante de um campo tangencial entre ciência e religião, entre fé e cura, o estudo científico da cura obtida através de mecanismos ditos espirituais.
A dimensão religiosa é inerente ao ser humano, portanto, é legítima sua adoção como objeto de estudo, além de profundamente necessária na atual conjuntura globalizada em que vivemos. Nossa compreensão é que o estudo da dimensão religiosa se faz através da dimensão simbólica, ou, como diria Durkheim, através das representações.
As dimensões simbólica e religiosa do ser humano devem ser compreendidas como expressões culturais de cada povo, que, por natureza, são múltiplas. A compreensão de que estes fenômenos não podem existir no singular, que eles sempre serão manifestações múltiplas, é a base da tolerância. Ao compreender que a humanidade é única, pois não existem múltiplas humanidades, ao aceitar que esta única humanidade produz uma fabulosa miríade de produções culturais singulares, dá-se um grande passo no sentido do acolhimento do “outro” e de suas “crenças”. É a resolução da diversidade na unidade. Entretanto, este acolhimento da multiplicidade não é espontâneo, ele deve ser ensinado desde a infância, no ambiente escolar, visto que o ambiente familiar é o espaço adequado para a adoção (ou não) de uma religião. Contudo, nem a profissão de um credo, nem a negação de todos os credos é impedimento para que a criança compreenda como as religiões surgiram, como se desenvolveram e como interagem com as demais em cada período histórico. O domínio destas informações faz parte do bom convívio em sociedade e pouco tem a ver com fé.
Embora entendamos desta forma, pois nos alinhamos com as resoluções do FONAPER, Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso, que existe há mais de uma década, o Brasil ainda está envolto numa dificuldade epistemológica ao confundir “Ensino Religioso” com “Ensino das Religiões”.
A denominação "Ensino Religioso" é incorreta e seu uso pela Escola Pública deveria ser evitado, pois, assim como não existe "ensino matemático", "ensino histórico", "ensino geográfico", "ensino sociológico", "ensino filosófico", não deveria existir o "ensino religioso". O Ensino não pode ser adjetivado.
É bem verdade que a denominação "Ensino Religioso" reflete o tempo do domínio católico romano e seu amálgama com o Estado. É preciso mudá-la, mas isto exige uma mudança na própria Constituição, no seu art. 210, e consequentemente na LDB, no seu art. 33.
O Estado deve oferecer o Ensino das Religiões, entendido como estudo do fenômeno religioso, uma das dimensões que compõem o ser humano e a vida em sociedade, baseado, portanto, nas dimensões sociológica, antropológicas histórica e social dos indivíduos e grupos, fenômeno relacionado a um tempo histórico e uma localização espacial. Mas, assim como outro qualquer, este conteúdo só pode ser repassado aos alunos se o professor tiver uma formação específica para isso.
O professor de Ciências das Religiões tem um papel significativo no globalizado mundo contemporâneo, que requer o exercício da convivência com as diferenças, sobretudo religiosas. Mais do que nunca é fundamental compreender – para poder ensinar – o significado do fenômeno religioso na formação individual e na conduta social dos indivíduos. Entretanto, como o professor do ensino fundamental não foi capacitado para isso, esse componente curricular, por mais que o FONAPER envide esforços propondo os conteúdos através dos Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, existe uma tendência por parte dos professores, em trabalhar de forma confessional porque não existe uma formação específica, salvo em alguns Estados da Federação que já caminham neste sentido desde o advento da nova Lei. Temos conhecimento que nas escolas públicas estaduais da Paraíba, se faz um esforço de trabalhar tais conteúdos de forma correta, inicialmente como prevê a Lei 5.692/71 (Valores) e agora com a Lei 9.394/96 (Fenômeno Religioso). Sendo este o segundo ano de implantação do Ensino Religioso no Sistema Municipal de Educação, os conteúdos são trabalhados de acordo com os PCNs do Ensino Religioso, ainda de forma precária por não haver professores com a devida habilitação.
Pelo exposto, a proposta do I Simpósio Internacional de Ciências das Religiões é discutir amplamente as temáticas aqui levantadas, conforme a seguinte programação:”
[1] CASSIRER, Ernest. Ensaio sobre o homem: Introdução a uma filosofia da cultura humana. SP: Martins Fontes
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
(http://www.cchla.ufpb.br/simposioreligio/index.php?option=com_content&task=view&id=2&itemid=3)
“Justificativa
O Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões – PPGCR – foi autorizado pela CAPES em julho de 2006. É o primeiro programa do Nordeste e o segundo do Brasil a ser oferecido por uma universidade federal; todos os demais são programas oferecidos por universidades confessionais.
Mais que um curso novo, somos inovadores. O PPGCR resultou do GIP-RELIGARE - Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Religião e Religiosidade - e do êxito da experiência do Curso de Especialização em Ciências das Religiões - CECR . Vale ressaltar que o PPGCR é o primeiro programa de pós-graduação a se intitular no plural – CiênciaS das ReligiõeS - por acreditarmos na existência da multiplicidade dos métodos para se chegar ao conhecimento, tanto quanto na multiplicidade do nosso objeto de estudo: as Religiões.
Depois de séculos de predomínio polarizado entre religião e ciência, hoje temos condições de olhar para trás e ver que, se a ciência foi redutora em seus primórdios, por presumir que detinha a "verdade absoluta", ela foi grandiosa no combate à intolerância, ao livrar o Ocidente da estreiteza da "verdade absoluta” imposta pelo catolicismo romano, deixado por Constantino e aprofundado nos tempos inquisitoriais. Depois de ter sido adotado oficialmente pelo Império Romano, a “religião” passou a ser sinônimo de "Igreja Católica Romana" ou, no máximo, "cristianismo". Assim, nada mais “natural” do que a utilização monolítica dos termos "ciência" e "religião" no singular.
Entretanto, a realidade é dinâmica e tudo muda. Depois de séculos de dogmatismos, religioso ou científico, a humanidade está redescobrindo que tudo é relativo, que neste mundo dialético não é possível nenhuma verdade absoluta, que ela é sempre relativa, não importa de onde venha.
Ernest Cassirer[1] no Ensaio sobre o Homem, afirma que “deveríamos definir o ser humano como animal simbolicum, e não como animal rationale”. Para Cassirer, a dimensão racional exclui a dimensão imagética e emocional reduzindo o ser humano a apenas um aspecto de sua inteireza. O ser humano é muito mais que um ser racional. O ser humano só é o que é pela interação complementar entre compreender e sentir, entre razão e sensibilidade, e ambas são expressas através da dimensão simbólica.
Observada a linha do tempo, as Ciências das Religiões parecem ser uma área recente de estudos, mas quando cotejada com as Ciências Sociais, ambas têm a mesma origem e os mesmos fundadores. Embora nascido concomitantemente com as Ciências Sociais, o estudo das religiões permaneceu como sub-área dentro da Sociologia e da Antropologia e só, recentemente, vem adquirindo relevância cada vez mais expressiva, não pelo desejo dos seus teóricos, mas por um imperativo colocado pela própria realidade.
Acreditamos que os graves problemas colocados pelo mundo contemporâneo estão dando à humanidade a oportunidade de refletir sobre dogmas e intolerâncias. Questioná-los e discuti-los pode levar a humanidade a dar-se conta de uma outra possibilidade, a de que Deus foi, é, e sempre será re-criado à imagem e semelhança dos seres humanos, homens e mulheres de cada tempo, de cada lugar, de cada civilização. Os seres humanos são produto e produtores de cultura. Cultura é diversidade, é multiplicidade, é metamorfose constante, integrada aos diferentes tempos históricos e espaços geográficos. A tarefa do mundo científico é compreender esta dimensão humana e suas repercussões para a vida em sociedade.
Este é o propósito do PPGCR. Ele nasceu plural e laico, portanto, não se coloca na perspectiva de um curso de teologia. Seu objeto de estudo não é Deus, mas compreender como os seres humanos criam os seus deuses e suas religiões, e, consequentemente, os códigos de conduta que se relacionam a estas representações. Esta dimensão será abordada na linha de pesquisa intitulada Religião, Cultura e Produções Simbólicas.
A segunda linha de pesquisa do programa se intitula Espiritualidade e Saúde. Ela busca estudar a correlação entre fé e cura, e nisso o PPGCR é igualmente inovador, por ter lançado uma linha de pesquisa que se propõe estudar a relação entre Espiritualidade e Saúde dentro dos métodos científicos.
A proposição desta linha de pesquisa só foi possível por fazermos parte de uma universidade federal que tem curso de medicina há mais de 30 anos. Três dos cinco docentes integrantes desta linha de pesquisa são professores de medicina há mais de 20 anos, sendo dois professores de Imunologia, cujos estudos de ponta abarcam as dimensões psicológica e imagética do paciente (psiconeuroimunendocrinologia).
Por outro lado, estudos recentes internacionais comprovam a eficácia de certas práticas “complementares” à medicina tradicional, que atuam favoravelmente sobre a saúde, ocasionando as chamadas "curas milagrosas" realizadas pelas vias espirituais. Estamos diante de um campo tangencial entre ciência e religião, entre fé e cura, o estudo científico da cura obtida através de mecanismos ditos espirituais.
A dimensão religiosa é inerente ao ser humano, portanto, é legítima sua adoção como objeto de estudo, além de profundamente necessária na atual conjuntura globalizada em que vivemos. Nossa compreensão é que o estudo da dimensão religiosa se faz através da dimensão simbólica, ou, como diria Durkheim, através das representações.
As dimensões simbólica e religiosa do ser humano devem ser compreendidas como expressões culturais de cada povo, que, por natureza, são múltiplas. A compreensão de que estes fenômenos não podem existir no singular, que eles sempre serão manifestações múltiplas, é a base da tolerância. Ao compreender que a humanidade é única, pois não existem múltiplas humanidades, ao aceitar que esta única humanidade produz uma fabulosa miríade de produções culturais singulares, dá-se um grande passo no sentido do acolhimento do “outro” e de suas “crenças”. É a resolução da diversidade na unidade. Entretanto, este acolhimento da multiplicidade não é espontâneo, ele deve ser ensinado desde a infância, no ambiente escolar, visto que o ambiente familiar é o espaço adequado para a adoção (ou não) de uma religião. Contudo, nem a profissão de um credo, nem a negação de todos os credos é impedimento para que a criança compreenda como as religiões surgiram, como se desenvolveram e como interagem com as demais em cada período histórico. O domínio destas informações faz parte do bom convívio em sociedade e pouco tem a ver com fé.
Embora entendamos desta forma, pois nos alinhamos com as resoluções do FONAPER, Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso, que existe há mais de uma década, o Brasil ainda está envolto numa dificuldade epistemológica ao confundir “Ensino Religioso” com “Ensino das Religiões”.
A denominação "Ensino Religioso" é incorreta e seu uso pela Escola Pública deveria ser evitado, pois, assim como não existe "ensino matemático", "ensino histórico", "ensino geográfico", "ensino sociológico", "ensino filosófico", não deveria existir o "ensino religioso". O Ensino não pode ser adjetivado.
É bem verdade que a denominação "Ensino Religioso" reflete o tempo do domínio católico romano e seu amálgama com o Estado. É preciso mudá-la, mas isto exige uma mudança na própria Constituição, no seu art. 210, e consequentemente na LDB, no seu art. 33.
O Estado deve oferecer o Ensino das Religiões, entendido como estudo do fenômeno religioso, uma das dimensões que compõem o ser humano e a vida em sociedade, baseado, portanto, nas dimensões sociológica, antropológicas histórica e social dos indivíduos e grupos, fenômeno relacionado a um tempo histórico e uma localização espacial. Mas, assim como outro qualquer, este conteúdo só pode ser repassado aos alunos se o professor tiver uma formação específica para isso.
O professor de Ciências das Religiões tem um papel significativo no globalizado mundo contemporâneo, que requer o exercício da convivência com as diferenças, sobretudo religiosas. Mais do que nunca é fundamental compreender – para poder ensinar – o significado do fenômeno religioso na formação individual e na conduta social dos indivíduos. Entretanto, como o professor do ensino fundamental não foi capacitado para isso, esse componente curricular, por mais que o FONAPER envide esforços propondo os conteúdos através dos Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, existe uma tendência por parte dos professores, em trabalhar de forma confessional porque não existe uma formação específica, salvo em alguns Estados da Federação que já caminham neste sentido desde o advento da nova Lei. Temos conhecimento que nas escolas públicas estaduais da Paraíba, se faz um esforço de trabalhar tais conteúdos de forma correta, inicialmente como prevê a Lei 5.692/71 (Valores) e agora com a Lei 9.394/96 (Fenômeno Religioso). Sendo este o segundo ano de implantação do Ensino Religioso no Sistema Municipal de Educação, os conteúdos são trabalhados de acordo com os PCNs do Ensino Religioso, ainda de forma precária por não haver professores com a devida habilitação.
Pelo exposto, a proposta do I Simpósio Internacional de Ciências das Religiões é discutir amplamente as temáticas aqui levantadas, conforme a seguinte programação:”
[1] CASSIRER, Ernest. Ensaio sobre o homem: Introdução a uma filosofia da cultura humana. SP: Martins Fontes